Em 1990 a Universidade do Porto atribuiu o título de doutor honoris causa a três personalidades da vida nacional e internacional: ao Presidente da República Portuguesa Mário Soares (1924-2017), por proposta da Faculdade de Letras; ao cientista António Barros Machado (1912-2002), por proposta do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar; e ao nefrologista Jean Hamburger (1909-1992), por proposta da Faculdade de Medicina.
Mário Alberto Nobre Lopes Soares nasceu em Lisboa, cidade onde estudou no Colégio Moderno e se licenciou em Histórico-Filosóficas e em Direito, respetivamente nas Faculdades de Letras e de Direito da Universidade de Lisboa.
Foi professor do ensino secundário privado, diretor do Colégio Moderno e exerceu advocacia. Durante o exílio em França foi Chargé de Cours nas universidades de Vincennes e da Sorbonne e professor associado na Faculdade de Letras da Universidade da Alta Bretanha, em Rennes.
Nos anos 40 e 50, ainda estudante, integrou o Movimento de Unidade Nacional Antifascista, foi membro da Comissão Central do Movimento de Unidade Democrática, fundador do MUD juvenil, secretário da Comissão Central da Candidatura à Presidência da República do General Norton de Matos e fez parte do Diretório Democrático-Social e da Comissão da Candidatura do General Humberto Delgado à Presidência da República.
Nos anos seguintes foi membro da Resistência Republicana Socialista, promotor do Programa de Democratização da República e candidato a deputado pela Oposição Democrática e pela CEUD. Foi preso 12 vezes pela PIDE e esteve exilado em França. Entre 1973 e 1985 foi secretário-geral do Partido Socialista.
No regresso a Portugal a 28 de abril de 1974 foi encarregue pela Junta de Salvação Nacional de obter o reconhecimento democrático do novo regime junto das capitais europeias.
Durante trinta anos ocupou altos cargos políticos. Foi vice-presidente da Internacional Socialista, ministro dos Negócios Estrangeiros (1.º e 2.º governos provisórios), ministro sem pasta (3.º e 4.º governos provisórios), primeiro-ministro (1.º e 2.º governos constitucionais e 9.º governo constitucional), presidente da República (eleito em 1986 e reeleito em 1991) e deputado ao Parlamento Europeu (1999-2004).
Foi ainda Conselheiro de Estado, presidente da Fundação Mário Soares, presidente da Fundação Portugal-África e da Comissão da Liberdade Religiosa.
Publicou obras de teor político. Foi também professor catedrático convidado da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra e da Universidade Lusófona. Era membro honorário da Academia das Ciências de Lisboa, da Sociedade Portuguesa de Autores, da Sociedade Portuguesa de Escritores, presidente do Conselho de Patronos da Fundação Arpad Szennes/Vieira da Silva e membro do júri do Prémio Pessoa.
Presidiu e integrou inúmeras e relevantes comissões internacionais e foi membro correspondente e honorário de muitas academias artísticas, educativas, científicas, entre outras.
Foi distinguido com o título de doutor honoris causa por 39 outras universidades nacionais, espanholas, brasileiras, europeias (da Bélgica, França, Irlanda, Itália, Malta, Reino Unido, República Federal da Alemanha), norte-americanas (do México e do Canadá) e ainda da Turquia, das Filipinas e da Coreia do Sul.
Era casado, desde 1949, com Maria de Jesus Simões Barroso Soares, e pai de Isabel e João Soares.
António Barros Machado era filho de António Luís Machado Guimarães, professor da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto (FCUP) e neto do Presidente da República Bernardino Luís Machado Guimarães (1851-1944).
Em 1931 escreveu com Emídio Guerreiro “Grito dos Estudantes do Porto aos Trabalhadores, Soldados e Estudantes de Portugal”. De seguida, frequentou o Curso Livre de Micologia do Instituto de Botânica de Coimbra e foi exonerado das funções de assistente extraordinário de Zoologia da FCUP por ter assinado um “Protesto” dirigido às autoridades académicas.
Em Madrid, entre 1934 e 1936, foi bolseiro da Junta para Ampliación de estúdios e Investigaciones Cientificas e licenciou-se em Ciências Naturais.
De volta a Portugal licenciou-se em Ciências Biológicas na Universidade do Porto e foi investigador livre no Instituto de Zoologia. Nessa capacidade percorreu as principais regiões calcárias do país, produziu publicações científicas, realizou uma missão de estudo em Angola e visitou os museus de Leopoldville e de Bruxelas.
Nos anos 30 e 40 lecionou Ciências Biológicas, Geográficas e Físico-Químicas no Ensino Secundário. Estagiou no Muséum National d’Histoire Naturelle de Paris, Laboratoire de Vers et Crustacés. Ficou classificado em 1.º lugar nos concursos documentais para assistente de Botânica, na FCUP, e para assistente de Zoologia na Universidade de Coimbra. Foi nomeado professor examinador do Liceu Alexandre Herculano, no Porto, mas foi impedido de celebrar contrato para 2.º assistente da Faculdade de Ciências da Universidade de Coimbra por ter sido considerado “elemento desafeto ao Estado Novo”.
Em 1976, na abertura do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar, proferiu a lição “O Homem como elemento modificador do ecossistema mundial”.
Mais tarde, em 1996, Barros Machado foi reintegrado na Universidade do Porto como professor catedrático.
Durante a sua carreira foi diretor do Laboratório de Investigações Biológicas do Museu do Dundo e da Companhia de Diamantes de Angola, na Lunda; coeditor da Revista Ciências Biológicas; consultor científico da Companhia de Diamantes de Angola, Diamang e consultor da Eletronorte - Centrais Elétricas do Norte do Brasil.
Foi membro honorário da Société Royale Belge d’Entomologie, presidente da Sociedade Portuguesa de Entomologia, membro associado do Conselho Científico Africano ao Sul do Saara, vogal da Junta de Investigação Científica do Ultramar, membro correspondente do Muséum Nacional d’Histoire Naturelle de Paris, membro da Société Zoologique de France, membro correspondente da Academia das Ciências de Lisboa, membro da Liga da Proteção da Natureza e sócio de mérito da Sociedade Portuguesa de Entomologia.
Foi distinguido pelo trabalho realizado sobre as Glossinas da África Portuguesa com o Prémio Abílio Lopes do Rego, da Academia das Ciências de Lisboa; e em 1992 a presidência da República condecorou-o com o Grande Oficialato da Ordem do Infante Dom Henrique.
Era casado com Dora Lustig (1907-1986).
Jean Hamburger estudou na Universidade Paris-Sorbonne e licenciou-se em Medicina, na Faculdade de Medicina de Paris.
Foi médico do Hospital de Necker e professor de Clínica Nefrológica, em Paris, enquanto dirigia o Laboratório de Investigações do I.N.S.E.R.M., de estudo das doenças do rim, e o Laboratório dedicado à imunologia do enxerto – L.A. 122 do C.N.R.S.
Nos anos 60 e 70 presidiu à Sociedade Internacional de Nefrologia e à Sociedade Internacional de Transplantação. Foi fundador e vice-presidente da Fundação para a Investigação Médica Francesa e presidente do Conselho de Administração do Palácio da Descoberta.
A ele se devem: a criação do conceito de reanimação médica, disciplina enunciada no seu livro Techniques de réanimation médicale et de contrôle de l’équilibre humoral en médicine d’urgence (1954). Jean Hamburger dirigiu a equipa que criou o primeiro rim artificial francês. A ele se deve o primeiro caso mundial de transplantação renal entre não-gémeos com tolerância prolongada (1953), um dos primeiros casos de transplantação renal com sucesso realizada entre falsos gémeos (1959) e o primeiro sucesso mundial de transplantação entre não–gémeos (1962) com um recetador de perfeita saúde.
Publicou, em 1971, a obra La transplantation rénale, théorie et pratique e instituiu um laboratório de imunologia, onde foram descobertos novos mediadores da imunidade, a hormona tímica circulatória e novos factos relativos à diabetes e às doenças autoimunes.
Foi membro de várias academias médicas internacionais e agraciado com os títulos de membro do Conselho da Ordem Nacional da Legião de Honra, de Comendador da Ordem das Artes e das Letras, de Grão-oficial da Ordem Nacional do Mérito e de doutor honoris causa pelas universidades de Atenas, de Buenos Aires, de Edimburgo, de Genebra, de Lovaina, de Lund, de Liège e de Montreal.
Obteve ainda o grande prémio da National Kidney Foundation (E.U.A.) e o prémio “John Peters”, da American Society of Nephrology.
Foi autor, entre outras obras, do best-seller La Puissance et la Fragilité (editado em 1972 e reeditado em 1990) e dirigiu o Dicionnnaire de Medicine (1989).
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