André Teixeira


Tem 41 anos, nasceu e reside em Chaves.


Profissionalmente é professor de Pilates, gestor e agricultor. Fundou, com amigos, a Soresa, empresa que produz e comercializa amêndoa, azeite, castanha, goji e mel. 


"Os anos na faculdade deram-me organização, capacidade de trabalho e rigor. Ensinaram-me

 a ter opinião crítica e a desconfiar de verdades absolutas; a olhar para os pormenores

 e perceber que são, muitas vezes, “pormaiores!",  André Teixeira

O André foi estudante de licenciatura na FADEUP. Quer falar-nos sobre o seu percurso profissional?

Entrei para a Faculdade de Desporto em 2001, quando estava ligado ao futebol, como jogador júnior do Boavista Futebol Clube. A carga de treinos que tínhamos na altura impedia-me, muitas vezes, de estar presente em aulas ou em momentos até da própria praxe, que na altura me deixava com alguma pena. No entanto, a esperança que mantinha na altura de poder seguir uma carreira no futebol justificava esse esforço. Acabei por fazer apenas um ano como jogador profissional na 2ª liga e, como a experiência não foi o que esperava, optei de imediato por me focar em terminar o curso. Comecei, desde logo, a estabelecer uma ligação ao treino em futebol, com várias funções em escolas de futebol e clubes, enquanto acabava o curso. No ano de estágio curricular, fui viver para Braga, onde continuei ligado ao treino em futebol e onde tive um fantástico orientador, que me deixou apaixonado pelo ensino. Lembro-me claramente que acabei o ano de estágio extremamente motivado para seguir a via ensino, no entanto, algumas oportunidades que foram surgindo e a realização que me proporcionaram fizeram com o que caminho a seguir fosse bem diferente. No mesmo ano, em Braga, comecei por ter algumas experiências na área de academias e surgiu-me a oportunidade de fazer uma primeira edição, em Portugal, de um Master em Pilates Tradicional, lecionado por discípulos do próprio criador do Método. O Pilates era, na altura, ainda muito pouco conhecido e pareceu-me extremamente interessante. Fiz a formação em Lisboa durante um ano e, daí em diante, não parei mais de trabalhar com o método, primeiro em Braga, depois no Porto, depois um ano em Andorra, quando quis fazer um ano sabático e repensar o rumo a seguir, e, depois de regressar ao país, na minha terra natal, em Chaves. Entretanto, fiz várias formações em osteopatia, DNS e outras terapias que me pareciam coadjuvantes interessantes para o Pilates e que se complementavam bem. Mantive sempre a minha ligação ao treino de futebol, por onde passei até há dois anos atrás, quando nasceu o meu segundo filho, pois entendi que seria a altura para me dedicar à família de forma mais presente e porque, entretanto, a empresa que havia criado também era um “bebé” que me requeria cada vez mais tempo.

 

E porque escolheu a área do Desporto para a sua formação? Quando percebeu que era esse o caminho a seguir?

Comecei a jogar futebol de forma mais organizada aos 13 anos em Chaves. No entanto, como eu era de uma pequena aldeia, que ainda ficava a 30 minutos de Chaves, e era inviável aos meus pais levarem-me três ou quatro dias por semana aos treinos, fui viver para Chaves com essa idade, para uma residência de estudantes. Lembro-me que foi lá que fiz a transição do 9º ano para o 10º e onde tive um professor de Educação Física que, claramente, me convenceu a seguir a área de Desporto. Desde aí, que a opção se manteve, até porque dois anos depois, fui viver para o Porto e, na altura, com um contrato de formação com o Boavista, que encarei como uma bolsa de estudos que em permitia alimentar o sonho do futebol enquanto acabava os meus estudos secundários. Foram anos complicados, a viver no clube, rodeado de atletas que não equacionavam outro futuro exceto o futebol, com treinos diários, às vezes meses sem ver os meus pais, e eu a tentar manter um nível alto, quer no futebol, quer na parte escolar. Consegui entrar na faculdade, ainda ligado ao clube, e confesso que durante esses anos, com a exigência altíssima a todos os níveis, nem tempo havia para repensar o caminho. Nesta vertigem, o objetivo era manter o sonho futebol presente e conseguir o acesso ao ensino superior na área do Desporto, não ponderava sequer outra opção.

 

E porque escolheu a FADEUP?

A Faculdade de Desporto, já na altura era uma referência na área e estando na cidade onde morava, era o objetivo.

 

O André iniciou a sua carreira profissional na área da atividade física, à qual continua ligado, mas decidiu tornar-se um empreendedor agrícola, dedicando-se a um projeto (Soresa) nesta área, que o levou, inclusivamente, a ingressar numa segunda licenciatura, em Engenharia Agronómica. O que motivou esta mudança da área da atividade física para um projeto agrícola? Como surge da ideia?

Quando decidi fazer um ano sabático, saindo do país para ter uma experiência fora, tinha dois grandes objetivos: em primeiro lugar, decidir o que faria de seguida, pois sentia que chegava a altura de tomar uma decisão importante relativamente à herança familiar ligada à agricultura; e, depois, testar os conhecimentos que levava comigo, quer na área do treino de futebol, quer do Método Pilates. Relativamente à “bagagem”/preparação, senti que estaria capaz de vingar em qualquer local, desde que dominando as línguas (que era algo que sempre gostei e onde não tive grandes dificuldades) e, em cerca de um ano, consegui reunir várias propostas de trabalho. Mas, ao mesmo tempo, tinha que decidir, sendo eu filho único, se abandonava o legado familiar ou o abraçava e começava a construir algo ligado a esse meio. Decidi que regressaria à terra natal e convidei um amigo e infância a criar uma empresa com o intuito de ultrapassar aquilo que nos pareciam as maiores dificuldades da área agrícola, nomeadamente a desvalorização dos produtos, a pequena escala que tínhamos, com todas as dificuldades que isso acarreta, e a falta de recursos humanos. Decidimos pegar nos produtos que produzíamos, melhorar ao máximo o que nos era possível, desde a produção até à comercialização dos produtos, e criar uma imagem moderna para podermos competir com os melhores. A entrada em Engenharia Agronómica fez sentido para juntar ao que de empírico fui aprendendo nas minhas vivências agrícolas com o conhecimento científico. Queria perceber o que de novo se fazia e como se fazia, estar capaz de fazer toda a gestão da exploração duma forma mais científica e conhecedora. A licenciatura não foi acabada, mas não ponho de lado que a termine nos próximos anos. No entanto, consegui o que pretendia: adquirir conhecimentos e ligar-me a pessoas de referência na área com quem continuo a discutir assuntos quando preciso.

 

E em que consiste esse projeto? Que tipo de produtos trabalham e o que o distingue de outros projetos da área?

Como acabei de explicar, a nossa empresa, que se chama Soresa, quis reunir duas famílias à volta de um projeto comum. A ideia era aproveitar as valências de cada um dos sócios para desenvolver uma imagem moderna e ter capacidade de procurar canais de comercialização diretos para os nossos produtos, evitando os intermediários ou a venda dos produtos a granel, que acabam sempre por desvalorizar aqueles que deveriam ser os atores mais importantes em todo o processo: os agricultores. Quisemos valorizar o legado familiar e honrá-lo, levando-o além-fronteiras, vencer anualmente prémios internacionais e ver a nossa qualidade reconhecida. Ao invés de procurar isolarmo-nos da nossa região, tentamos, desde sempre, criar ligações com outras empresas, cooperando sempre que possível, no sentido de juntos sermos mais fortes. Creio que a nossa irreverência, capacidade de trabalho, ousadia e, ao mesmo tempo, esta criação de sinergias com empresas da área tem sido o segredo do que temos vindo a fazer.

 

Que principais desafios enfrenta enquanto empresário desta área de negócio?

Os desafios são enormes! Em termos de comercialização, para além do contexto atual, com incerteza internacional devido a pandemias, guerras, embargos, taxas aplicadas por determinados países, acho que a dificuldade maior tem a ver com o sermos ainda relativamente pequenos (como empresa e como país). Precisamos valorizar mais o que é nosso, acreditar no que fazemos bem e acreditar que a qualidade, uma vez reconhecida, triunfa em qualquer local/mercado. Custa abrir o caminho, desbravar terreno, bater a portas, chegar aos decisores importantes. Precisamos perceber a nossa realidade e saber que, sendo pequenos, teremos sempre que nos fazer ver pela excelência do que fazemos e não pela quantidade. No que toca ao terreno, ao sector agrícola em concreto, a dificuldade maior é a falta de recursos humanos, reflexo duma desvalorização e envelhecimento do sector que já não é de agora! Precisamos reinventar-nos, precisamos mostrar a dignidade do trabalho no campo e fazer valorizar quem nele trabalha. Se no desporto vivemos agora uma fase em que, creio, as pessoas voltam a despertar para a necessidade de cuidar do corpo, como parte indissociável daquilo que somos como seres humanos, de assumir essa responsabilidade, creio que há também uma consciência cada vez maior da importância de valorizarmos os alimentos locais, aqueles de que conhecemos a origem e em quem confiamos. O consumidor de hoje é cada vez mais informado, preocupado com a origem do que consome e valorizador de projetos em que acredita.

 

Paralelamente, é professor de Pilates. Onde é que se sente mais realizado, num estúdio de Pilates ou nos campos onde desenvolve o projeto Soresa?

Eu acredito que, mesmo estando no espaço onde nos sentimos valorizados e, simultaneamente, sentimos realização no que fazemos, quando nos deixamos sobrecarregar demasiado de trabalho, essa realização, esse prazer, desvanece-se. E, desta forma, mesmo adorando o futebol, mesmo adorando dar aulas de Pilates ou trabalhar na Soresa, tenho vindo a tentar equilibrar os meus dias para poder ter tempo para a família, principalmente (que, nesta fase, com dois filhos, nos exige imenso). Há momentos em que sinto claramente que, para ser um bom gestor, um bom professor e um bom pai, temos que estar presentes de corpo inteiro, e andava claramente a correr e a apagar fogos. Dessa forma, decidi deixar o futebol por um tempo e não dar aulas depois das 18:30.

Hoje, sinto-me realizado nos dois âmbitos! Gosto de saber que tenho as aulas cheias e o reconhecimento do nosso trabalho nesta vertente do exercício/saúde, gosto de saber que, em contexto clínico, a minha intervenção tem um efeito positivo quase imediato no bem-estar dos meus clientes e temos lista de espera de pessoas a querer trabalhar connosco. Ao mesmo tempo, ver a minha empresa a crescer, a empregar pessoas de que gosto, a ganhar prémios anualmente e a lançar-se sempre em novos desafios é algo que também me deixa muito feliz. Mas o mesmo acontecia com o treino em futebol, que também me deixa saudades e onde ainda tive o prazer de treinar fantásticos atletas como o Diogo Dalot ou o André Gomes, entre outros, muitos outros! E acredito que ainda há contextos fantásticos para se trabalhar, mesmo sabendo da falta de valores que, infelizmente, impera no futebol e com a qual não me identifico.

 

A sua formação em Desporto influencia de alguma forma a abordagem à atividade no setor agrícola?

Se olhar para o meu grupo de amigos da faculdade, vejo alguns na área da saúde, outros docentes universitários, outros ligados ao treino e outros empreendedores em várias áreas. Percebe-se facilmente o quão versáteis somos! Os anos na faculdade deram-me organização, capacidade de trabalho e rigor. Ensinaram-me a ter opinião crítica e a desconfiar de verdades absolutas; a olhar para os pormenores e perceber que são, muitas vezes, “pormaiores”! Que o detalhe faz toda a diferença! O Desporto, em si, ensinou-me a lutar pelo que acredito, a ser capaz de me levantar quando as coisas não correm bem, a conviver em equipa e valorizar a empatia pelo outro, tudo coisas que moldam, de forma importantíssima, aquilo que somos e a forma como tomamos decisões em todos os âmbitos da nossa vida. Acredito que o Desporto continua a ser uma fantástica escola para a vida.

 

Voltando à FADEUP, do que se recorda com mais saudade dos tempos de estudante?

As pessoas, obviamente! Recordo muitíssimo os amigos e, principalmente, o tempo que, na altura, parecia sobrar. As muitas horas que passamos juntos, quer a estudar, quer a divertir-nos. Muitas saudades desses tempos e dessas pessoas. Porque são as pessoas que nos marcam, não as instituições! Recordo muitos professores, alguns com mais apreço que outros, mas percebo o quanto me influenciaram. Recordo os funcionários e até os espaços da faculdade onde passávamos mais tempo. Recordo as aulas do Professor Virgílio na piscina, que me matavam a mim e à malta do andebol!! Recordo o professor Botelho e a sua exigência, com quem sempre simpatizei imenso. Recordo as jogatanas de futebol científico, que tinha o prazer de poder partilhar com alguns colegas e com os professores. Sempre achei que se conhece imenso duma pessoa num campo de futebol, pela forma como joga, como interage com o outro em contexto de jogo, e sentia-me um privilegiado por me convidarem a jogar com eles e de, certa forma, estreitar laços. Os Professores André Seabra, José Soares, Júlio Garganta, José Mário Cachada. O apaixonante Professor Vitor Frade! As aulas do Professor Leandro Massada! Estas e tantas outras que vamos mantendo vivas nos poucos encontros de colegas desse tempo, mas foram anos muito felizes.

 

Qual é a sua maior realização até hoje?

Deixa-me extremamente feliz saber que estou a construir algo que nasceu duma vontade de honrar as nossas famílias, mas acho que nada se compara com a realização de construir uma família e de ter filhos. Hoje, sinto-me um privilegiado por poder trabalhar no que gosto, numa empresa minha, e continuar a ajudar as pessoas que comigo se cruzam a ter mais qualidade de vida ou ultrapassar problemas do foro motor. Mas criar uma família, com uma esposa fantástica e dois lindos filhos cheios de saúde, estando perto dos meus pais, numa cidade pequena, mas que simultaneamente nos dá tudo o que precisamos, onde consigo levar os meus dois filhos à escola a pé e ir também a pé para o trabalho, fazendo tudo isto em 15 minutos, é sem dúvida qualidade de vida, algo de que neste momento não abdicaria por nenhum preço!

 

Como ocupa os tempos livres?

Gosto muito de viajar, adoro conhecer outras realidades, adoro neve, gosto de música, de ler ou ver filmes, mas nesta fase da minha vida a minha semana é bastante preenchida entre as aulas, a empresa e a logística familiar. O tempo parece fugir-me por entre os dedos, mesmo com uma boa organização que tento ter. Para que possamos ter espaço para fazer os nossos treinos, para viajar, para permitir aos nossos filhos contactarem com outras realidades e terem boas experiências, é necessário, por vezes, um esforço extra e que não abdiquemos disso, que seja quase uma obrigação para a nossa sanidade mental!

 

Quer deixar algum conselho aos nossos estudantes?

Acho que, no mundo hipercompetitivo em que vivemos, na vertigem dos dias, o segredo maior é o equilíbrio! Equilíbrio entre a autoexigência e a tolerância, equilíbrio entre o trabalho e o lazer, equilíbrio entre a vertigem dos dias e a necessidade de calma. Absorvam o máximo possível, sejam esponjas, bebam das melhores fontes, se possível, sigam modelos de competência, mas também de comportamento, de humanidade! Adquiram competências na vossa área, mas, seguindo a máxima de Abel Salazar, não se fiquem por aí, apetrechem-se com competências paralelas, aprendam línguas, competências de gestão, etc... tudo vos será útil um dia. Sejam persistentes quando acreditam ou perseguem algo, mas não inflexíveis quando a vida vos apresentar novidade. Sejam humildes, nos contextos e com as pessoas que o merecem, que assim seja, mas não se deixem minimizar nem humilhar; todos nascemos iguais e com o direito de brilhar.

E sejam coerentes com vocês mesmos, ajustem o rumo periodicamente, façam planos a longo prazo, como dizia o professor Fonseca: “Não há ventos favoráveis para quem não sabe para onde quer ir!”.

 

O que espera do futuro?

No curto prazo, espero que a minha empresa continue a crescer, que os novos produtos a lançar tenham sucesso e as novas instalações sejam uma realidade ainda este ano. Que possamos também, ainda durante este ano, ter uma loja online a funcionar e poder chegar ainda a mais pessoas. Que a vida familiar continue equilibrada e seja capaz de manter à minha volta as pessoas que me fazem bem. Que possa continuar a proporcionar à minha família uma vida confortável e que caminhemos juntos com saúde muitos anos. Que o contexto internacional melhore e se vão alargando os círculos onde impera a consciência e a humanidade, onde se cuida do planeta de forma mais ativa e onde o respeito pelo outro volte a ser uma pedra basilar da nossa sociedade. É por isso que luto! 

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