Gökhan Bozkurt


Tem 39 anos, é natural de Çanakkale, Turquia, e reside na cidade do Porto. 


Profissionalmente, é agente FIFA e consultor nas áreas de gestão, estratégia e transferência de jogadores em clubes de futebol. É autor de um livro sobre Portugal e vários sobre a modalidade que abraçou enquanto profissional. 


​"A faculdade dava-me liberdade para estudar ao meu próprio ritmo. Os professores sempre foram muito pacientes e sempre me apoiaram. Além disso, cientificamente, 

a faculdade desafiava constantemente os estudantes a serem os melhores.",  Gökhan Bozkurt

O Gokhan foi estudante de doutoramento na FADEUP. Pode falar-nos do seu percurso profissional?

Trabalho no setor do futebol há 15 anos. Comecei num pequeno clube turco e fui construindo a minha carreira até alcançar o nível das principais divisões, tanto na liga portuguesa quanto na liga turca. Tenho, principalmente, duas áreas de especialização: sou gestor na área administrativa dos clubes e consultor para membros do conselho executivo e presidentes de clubes, especialmente nas áreas de gestão, estratégia e transferências de jogadores. Ao longo da minha carreira, também atuei em relações internacionais e no desenvolvimento de negócios internacionais. Além disso, trabalhei em agências de jogadores e em empresas de marketing desportivo. Atualmente, tenho uma empresa de consultoria e também sou agente licenciado pela FIFA.

 

Porque escolheu a área do Desporto para a sua formação? Quando percebeu que era esse o caminho a seguir?

Eu trabalhava num pequeno clube na Turquia, no Departamento de Administração, e essa experiência ajudou-me a perceber que, no setor do futebol, pelo menos na Turquia, infelizmente quase ninguém sabe nada sobre gestão. Saber de futebol é uma coisa, saber gerir um clube de futebol é outra completamente diferente. Não tinha ninguém a quem perguntar ou com quem aprender, porque até as pessoas mais experientes no setor faziam as coisas sem entender o motivo, apenas porque "sempre se fez assim". Foi aí que decidi estudar para aprender. Mudei-me para Portugal para estudar e aprender "gestão do futebol" num dos melhores países de futebol do mundo

 

E porque escolheu a FADEUP para realizar o seu doutoramento?

Primeiro, eu fiz um mestrado em Gestão do Desporto na Faculdade de Motricidade Humana. Enquanto estudante, fiz um estágio profissional no clube de futebol Estoril Praia. Durante esse período, concluí o mestrado e, por coincidência, o clube foi comprado pela Traffic Sports, uma das maiores empresas no negócio do futebol naquela época. Passei, então, a trabalhar para a Traffic como responsável pelo mercado turco. Esse trabalho não era de escritório, o que me permitia atuar de forma flexível, a partir de qualquer parte do país. Assim, decidi continuar a estudar e a aprofundar-me academicamente e cientificamente na área da gestão desportiva. Depois do mestrado, parecia natural avançar para o doutoramento nessa área. Naquele período, em 2013, quase não havia ninguém no setor do futebol com um PhD em Gestão do Desporto. Acreditei que isso poderia trazer um grande diferencial à minha carreira e comecei a procurar os melhores programas de doutoramento em Ciências do Desporto, com foco em Gestão do Desporto. Encontrei esse programa na Universidade do Porto. Foi um dos melhores programas académicos nessa área. Candidatei-me, fui aceite e comecei a estudar na FADEUP, enquanto continuava a trabalhar no setor do futebol.

 

O Gokhan é consultor de clubes de futebol, estando ligado à transferência de atletas. Quer falar-nos sobre no que consiste esta sua atividade profissional? Qual é o seu papel junto dos clubes?

Para esse trabalho, é necessário ter três coisas: conhecimento dos mercados, conhecimento dos jogadores e um bom networking. Ou seja, é fundamental entender as realidades do mercado, como o nível financeiro, as regras e as necessidades dos clubes. Além disso, no futebol, é igualmente importante o que se sabe e quem se conhece. E é essencial ter um personal branding. As pessoas precisam nos conhecer e, mais importante, confiar em nós. Quando forneço uma informação, o clube ou jogador precisa ter a certeza de que está a receber as opções mais corretas, confiáveis e funcionais. O meu trabalho é “abrir-lhes” os olhos e os ouvidos  para que possam ver melhor e ouvir mais longe. No fim, o que eu faço é construir pontes entre jogadores e clubes, e ninguém quer atravessar uma ponte em que não confia.

 

É recorrente ouvirmos comentários menos positivos sobre o papel dos agentes de atletas no futebol atual, numa perspetiva em que o futebol é, cada vez mais, um mundo de negócios que relega a componente desportiva para um plano inferior. Como é que, enquanto profissional da área, vê este tema?

Sim, é verdade que os agentes de jogadores geralmente têm uma má reputação. No passado, houve incidentes que prejudicaram os clubes tanto a nível financeiro como desportivo. Mas dizer simplesmente "a culpa é dos agentes" não resolve nada e apenas faz ignorar a raiz do problema. Eu costumo dizer que, se há um mau agente, é porque houve um mau gestor no clube. Se um agente enganou o clube, a principal razão para isso é a existência de dirigentes incompetentes que permitiram ser enganados. Se um agente vendeu um jogador de qualidade questionável ao clube, é porque o gestor do clube não fez uma boa avaliação dos jogadores nem uma pesquisa de mercado adequada. Acho que, até agora, participei em mais de 20 transferências internacionais em nome dos presidentes dos clubes que representei. Não me lembro de nenhuma delas ter sido prejudicial para os clubes, e todos esses negócios envolveram agentes oficiais. Felizmente, todos esses jogadores mostraram ser boas escolhas, com um custo financeiro baixo. Entao, o problema não são os agentes, o problema são as pessoas que são más ou incompetentes no setor. Na Turquia, temos um provérbio que diz: "O ladrão é culpado, mas quem deixa a porta da casa aberta não tem culpa?" Ninguém fala sobre as portas que são deixadas abertas de propósito dentro dos clubes.

 

Tendo em atenção o panorama atual no que concerne às transferências e contratos de atletas, como é que perspetiva o futuro? Que tipo de caminho seguirão clubes e atletas para defender os seus interesses?

Fazer networking hoje é muito mais fácil do que no passado. Já não é necessário viajar para outro país para realizar reuniões; basta ter internet e uma conta no Skype. As pessoas encontram-se e fazem negócios através do WhatsApp. Os clubes têm mais e melhores relações do que antes. Com plataformas como o TransferRoom, é muito mais fácil realizar negócios entre clubes sem precisar da intervenção de terceiros, como agentes. Além disso, o scouting tornou-se mais acessível. Lembro-me de que, no início da década de 2010, era necessário que os agentes viajassem para outros países, assistissem aos jogos ao vivo e apresentassem os talentos aos clubes. Agora, basta utilizar programas como o Wyscout para assistir jogos de todo o mundo, no conforto de casa. Antes, os agentes eram uma ferramenta indispensável para descobrir novos jogadores. Com a inteligência artificial (IA), o scouting está a tornar-se ainda mais fácil, graças a softwares especializados. Por isso, vejo que a importância dos agentes no scouting está a diminuir. No entanto, isso não significa que os agentes vão perder poder. Acredito que, no futuro, o serviço mais importante será a gestão de carreiras dos atletas. Isso inclui a gestão de reputação, gestão da vida pessoal, gestão dos direitos de imagem e marketing dos jogadores, bem como a gestão financeira e dos investimentos, entre outros aspetos. Assim, apenas os agentes com uma boa formação e amplo conhecimento conseguirão sobreviver. Penso que a intermediação nas transferências irá diminuir, mas a gestão estratégica das carreiras dos jogadores terá cada vez mais relevância e importância.

 

Como é que os clubes mais pequenos se podem proteger nesta vertente da modalidade?

Acho que, nesta altura da história, os pequenos clubes têm uma grande vantagem que nunca tiveram antes: a tecnologia. Existem inúmeras oportunidades, desde análises até metodologias de treino, passando por scouting e programas de CRM. Com esse poder, eles podem competir e sobreviver mais facilmente entre os grandes clubes. Claro que toda a tecnologia precisa de ser bem utilizada para trazer benefícios. E isso só é possível com a qualidade das pessoas que trabalham nos clubes.

 

Voltando à FADEUP, do que mais gostou do período que passou na Faculdade enquanto estudante?

A faculdade dava-me liberdade para estudar ao meu próprio ritmo. Os professores sempre foram muito pacientes e sempre me apoiaram. Além disso, cientificamente, a faculdade desafiava constantemente os estudantes a serem os melhores.

 

E desse período, há alguma história que o tenha marcado e que possa partilhar connosco?

No meu primeiro ano no programa de doutoramento, um clube turco contactou-me e pediu a minha ajuda para estabelecer comunicação com o FC Porto. Eu consegui os contactos, mas, devido à barreira linguística, também me pediram para intervir e ajudar a resolver um problema entre os dois clubes. A situação quase foi levada à FIFA e ao CAS, o que provavelmente resultaria numa proibição de transferências para o clube turco. Após alguns dias de trabalho, consegui resolver o problema entre os dois clubes. Antes de mim, dois advogados turcos tinham tentado, sem sucesso, e até complicaram a situação. Depois de eu resolver esta disputa difícil, o FC Porto ofereceu-me um estágio profissional no clube, onde eu tive a oportunidade de trabalhar durante um ano. Foi uma experiência extremamente enriquecedora e uma grande oportunidade de aprendizagem.

 

Qual é a sua maior realização?

Acho que a minha maior realização é conseguir manter-me íntegro num setor muitas vezes considerado sujo. Ser confiável para todas as pessoas com quem trabalho e, ao longo de 15 anos, não ter prejudicado ninguém nem participado em negócios prejudiciais é, para mim, um verdadeiro sucesso.

 

Como ocupa os tempos livres?

Gosto de ler e também sou autor. Tenho quatro livros publicados. Um deles é sobre Portugal, sendo o primeiro e único livro em turco sobre este país. Amo Portugal, e por isso quis apresentar este país maravilhoso ao povo turco. O livro inclui todas as informações essenciais, desde a história e cultura até à gastronomia e música. Os meus outros livros são sobre futebol. Em particular, o meu livro Scouting and Transfers in Football é um dos primeiros exemplos escritos nesta área e recebeu muitos elogios. Além disso, gosto de viajar e descobrir novas culturas. Viajar é, para mim, uma outra forma de estudar, pois aprendo muito durante as viagens. Acho que, até agora, já visitei mais de 65 países.

 

Quer deixar algum conselho aos nossos estudantes? 

Para quem deseja trabalhar no setor do futebol, um diploma nunca será suficiente. Por isso, o meu conselho é que, além de estudar, o que é importante, é fundamental sair das faculdades e procurar ativamente oportunidades para ganhar experiência no setor de futebol. Nos primeiros anos, nunca priorizem ganhar dinheiro; o mais importante é adquirir experiência e construir um bom networking. Mais tarde, essas duas coisas acabarão por vos trazer dinheiro.

 

O que espera do futuro?

Espero, no futuro, ocupar um cargo influente na Federação Turca de Futebol ou no Ministério do Desporto. Acredito que há muitas inovações a serem feitas para melhorar o futebol no nosso país, e gostaria de contribuir nesse sentido.

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