Exclusivo

Sociedade

E se o tratamento do cancro vier das anémonas-do-mar?

Investigadores da Universidade do Porto criaram oito moléculas com capacidade para eliminar células tumorais

O que têm a ver as anémonas-do-mar com o tratamento do cancro? A resposta poderá ser dada nos próximos três anos, na Faculdade de Ciências da Universidade do Porto (FCUP), com ensaios de uma nova terapia inspirada em moléculas que permitem aos pequenos animais marinhos produzirem luz. O potencial fármaco já produziu resultados auspiciosos em ensaios laboratoriais na Faculdade de Farmácia da Universidade do Porto com células tumorais de neuroblastoma, cancro da mama, da próstata e do cólon. Um pedido de patente está atualmente em análise. Os ensaios com animais devem iniciar-se em breve.

“Estamos a estudar a criação de uma empresa para podermos avançar com testes clínicos em humanos, mas sabemos que estes ensaios não serão feitos nos próximos três anos”, explica Luís Pinto da Silva, investigador da FCUP. “Os ensaios com humanos exigem investimentos avultados. E será necessário estabelecer parcerias para repartir investimentos e receitas”, acrescenta Joaquim Esteves, professor da FCUP.

O projeto ChemiTumorTher tem como ponto de partida uma molécula das anémonas que dá pelo nome de coelenterazina. Apesar de recorrerem às moléculas que estão na origem da bioluminescência destes animais, os investigadores não pretendem usar a luz para combater células tumorais — e também não preveem sacrificar anémonas para a extração de moléculas. Durante um primeiro projeto, financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT), os investigadores da FCUP desenvolveram oito moléculas candidatas a potenciais fármacos a partir da alteração da coelenterazina. Estas moléculas já podem ser sintetizadas em laboratório, o que significa que podem ser produzidas por métodos industriais. “São moléculas simples e não é muito complexo produzi-las a baixos custos”, refere Joaquim Esteves.

As oito moléculas desenvolvidas na FCUP têm duas características em comum: localizam células tumorais através de um oxidante conhecido por anião superóxido e, em vez da luz emitida pela coelenterazina, produzem oxigénio singleto que elimina as células doentes. “O anião superóxido funciona simultaneamente como marcador (que ajuda a localizar as células doentes) e um desencadeador da reação química”, acrescenta Luís Pinto da Silva.

Uma vez que o anião superóxido é produzido por vários tipos de células tumorais, os investigadores da FCUP mantêm a esperança de desenvolver nos próximos tempos um fármaco eficaz para diferentes cancros. A esta característica junta-se a possibilidade de eliminar as células tumorais que levam o cancro a expandir-se através de metástases.

“O ideal seria desenvolver um fármaco que pudesse ser administrado por via oral, mas é algo que ainda teremos de investigar depois dos ensaios com animais”, admite Luís Pinto da Silva. Os próximos três anos haverão de revelar a via mais indicada para estas moléculas combaterem o cancro.

Já é Subscritor?
Comprou o Expresso?Insira o código presente na Revista E para continuar a ler

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: senecahugo@gmail.com

Comentários
Já é Subscritor?
Comprou o Expresso?Insira o código presente na Revista E para se juntar ao debate
+ Vistas