Pedro Madureira: da bioquímica à vacina portuguesa
Percurso do investigador começou na FCUP
"A bioquímica deu-me a base do que faço hoje”. Foi assim que começou a nossa conversa com Pedro Madureira, co-fundador da spin-off da Universidade do Porto, Immunethep, que está a produzir a vacina portuguesa contra a Covid-19.
Há precisamente um ano estava com a sua equipa a entrar na corrida às vacinas. A sua dedicação à imunologia começou com um estágio na licenciatura em Bioquímica da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto (FCUP) e do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar (ICBAS). “No quarto ano havia uma Unidade Curricular de Imunologia e acabei por fazer o meu estágio nessa área”, conta.
“Na altura, o hot topic na imunologia era perceber de que forma é que moléculas de microrganismos influenciam o nosso sistema imune. Este sistema tem uma capacidade enorme de reconhecer moléculas”.
Em 2002, terminado o curso com ramo de especialização em Bioquímica Aplicada, este tópico levou-o ao doutoramento em Ciências Biomédicas, no ICBAS. Na descoberta das reações bioquímicas do nosso sistema imunológico, conseguiu identificar uma proteína, libertada por uma bactéria, que “desligava” o sistema imune dos recém-nascidos. “Conseguimos perceber: essa proteína é imunossupressora e impede uma resposta imune eficaz por parte do hospedeiro”.
"E se fizermos uma vacina que neutraliza essa proteína?"
Depois do doutoramento entrou no Instituto de Biologia Molecular e Celular, (atual i3S) para continuar esta investigação. “Se nós somos suscetíveis a uma infeção porque uma bactéria liberta essa proteína, então o que acontece se nós tivermos uma vacina que neutraliza essa proteína? Será que há outras bactérias com o mesmo mecanismo?” Em 2013, dois anos após terminar o doutoramento, ajudou a criar a Immunethep, uma empresa de biotecnologia cujo objetivo é o desenvolvimento de imunoterapias que permitam prevenir ou tratar infeções causadas por bactérias. Esta “veia” empreendedora, conta, veio por “puro acaso”. “O meu trabalho é a investigação e sempre gostei da investigação aplicada”, diz-nos.
Juntou-se à Venture Catalysts e foi nesta empresa que viu consumada uma aliança entre o potencial tecnológico e a investigação que estava a desenvolver. “No nosso caso desenvolvemos uma vacina para 5 bactérias diferentes que já está em ensaios clínicos”, conta.
Mas não ficaram apenas pela vacina. Como quem já está infetado por estas bactérias, como a Escherichia coli, por exemplo, não pode ser vacinado, pensaram num fármaco à base de anticorpos.
Atuar no vírus como um todo
Já com know-how e contactos na área das vacinas, no início da pandemia surgiu a decisão, de forma rápida, de criar uma vacina contra a Covid-19. “Quando começámos a discutir, a ideia de ser intranasal foi imediata para garantir uma forte imunidade no local de entrada do vírus”. Não foi a única razão. Pensaram também na imunidade de grupo e nos países subdesenvolvidos: “Nestes países nem sempre é fácil arranjar quem administre estas vacinas e para além disso garantimos que não há falha de matéria-prima para a sua administração”. Quando questionado sobre a eficácia contra as novas estirpes, conta que a vacina foi criada para atuar sobre o vírus como um todo e não apenas para uma parte que pode sofrer mutações. "Desde o início que a nossa estratégia foi essa de forma a impedir que haja novas variantes que escapem à eficácia da vacina".
Neste momento, a vacina portuguesa está dependente de financiamento por parte do Governo para avançar para ensaios clínicos. “Se não pararmos, o nosso plano é em julho, estarmos a acabar os ensaios pré-clínicos, começarmos os ensaios clínicos e em 2022 termos a vacina no mercado”.
“Já tivemos reuniões com o Infarmed e estamos a preparar a reunião com a Agência Europeia de Medicamentos. Estamos a fazer tudo o que podemos para ir adiantando", conta.
Terminámos a conversa com a motivação e da satisfação para o seu trabalho. Hoje em dia, Pedro Madureira, para além de co-fundador da Immunethep, é investigador no grupo Immunobiology do i3S – Instituto de Investigação e Inovação em Saúde da U.Porto. Este cientista natural do Porto não esconde a satisfação de poder “criar um produto, fazer investigação e essa investigação ajudar as pessoas”.
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Renata Silva. SICC. 13-05-2021