Investigadores U.Porto

U.Porto Reitoria SIP
Ana Paula Mucha
Centro Interdisciplinar de Investigação Marinha e Ambiental e Faculdade de Ciências da Universidade do Porto

Investigadora Principal do projeto OCEAN3R


Fale-nos um pouco sobre o seu percurso científico na U.Porto.
O meu percurso na U.Porto começou em 1989, quando ingressei no curso de Ciências do Meio Aquático, no ICBAS. Foi também no ICBAS que me doutorei em 2002, tendo posteriormente ingressado no CIIMAR como investigadora Pós-Doc, onde comecei a desenvolver trabalho de investigação relacionado com a utilização de microrganismos e plantas para a recuperação de ecossistema estuarinos e costeiros, através de processos de biorremediação e fitorremediação. Em 2005 fui contratada como investigadora pelo CIIMAR, e em 2012 formei, juntamente com mais duas colegas, o grupo de investigação ECOBIOTEC (Bioremediation and Ecosystems Functioning), o que me permitiu começar a desenvolver investigação de forma independente, integrando equipas multidisciplinares em diversos projetos nacionais e internacionais. Atualmente sou também docente convidada no Departamento de Biologia da FCUP.

FO que simboliza para si ser a investigadora principal no projeto OCEAN3R (Reduce pressures, restore and regenerate the NW-Portuguese ocean and waters)?
O projeto OCEAN3R envolve uma vasta equipa de investigadores do CIIMAR que desenvolvem trabalho em diferentes áreas de investigação (Biotecnologia Marinha; Alterações Globais e Serviços de Ecossistemas; Biologia e Aquacultura). É para mim muito gratificante poder trabalhar com todos estes colegas, colocando a investigação de excelência desenvolvida no CIIMAR ao serviço desta importante missão europeia de restauração de oceanos e águas interiores, e reforçando também o nosso envolvimento em redes internacionais de investigação e desenvolvimento.

Pode dar-nos algumas informações sobre a missão e os objetivos deste projeto?
O projeto OCEAN3R está alinhado com a “Missão Starfish 2030: Restaurar os nossos Oceanos e Águas”, contribuindo para os seus três objetivos temáticos: poluição zero, regeneração de ecossistemas aquáticos e marinhos e descarbonização dos oceanos e águas interiores. Na temática da poluição zero, pretende-se dar resposta a três importantes fontes de poluição da costa NW portuguesa: a eutrofização devido ao excesso de nutrientes, as descargas de poluentes de origem terrestre e de atividades marítimas, e o lixo marinho encontrado nas praias, e à superfície e fundo do mar. No âmbito da recuperação de habitats degradados, o projeto pretende combinar abordagens inovadoras para avaliação das espécies aquáticas baseadas na genética e genómica, a avaliação das condições e dinâmicas dos habitats aquáticos, e o desenvolvimento de soluções para a sua regeneração. Em termos de estratégias de descarbonização, o projeto contribuirá para a promoção da produção de peixe neutra em carbono, da fixação de carbono através do cultivo de algas, e de novas tecnologias para produção de energia verde.

Qual a pertinência ambiental deste projeto, nomeadamente na sensibilização, promoção de responsabilidade e participação?
Além dos objetivos temáticos, o projeto OCEAN3R tem também um importante objetivo transversal de colmatar lacunas de conhecimento e de relação emocional dos cidadãos com os habitats e ecossistemas aquáticos e marinhos. A estratégia passa, por um lado, pela disponibilização de dados em modelo de ciência aberta, em linha com as atuais orientações da Comunidade Europeia, e pela tradução desses dados em conhecimento que possa ser facilmente disponibilizado aos cidadãos, e, por outro lado, pela mobilização desses cidadãos para que possam ser participantes ativos nas atividades de proteção e recuperação dos ecossistemas aquáticos e costeiros. O envolvimento emocional e informado dos cidadãos com os Oceanos é essencial para o sucesso da missão.

O OCEAN3R foi o único projeto financiado do CIIMAR pelo Norte 2020 alinhado com as áreas do Horizonte Europa. Que aspetos salienta na promoção de uma candidatura ganhadora?
O CIIMAR optou por mobilizar os seus investigadores em torno da área de missão “Oceanos, mares, águas costeiras e interiores saudáveis”, apresentando uma candidatura abrangente e robusta, alicerçada na qualidade da equipa de investigação e nas provas dadas em projetos anteriores.

Portugal, um país cuja história é indissociável do mar, apresenta dados preocupantes relativos a poluição marítima causada pela presença de microplásticos, que afetam os ecossistemas marinhos. Na sua opinião, existem ainda muitas questões em aberto em relação aos impactos dos microplásticos nos ecossistemas e na saúde humana?
Infelizmente este é um problema global e de difícil resolução. O papel dos investigadores passa não só pela compreensão dos impactos dos microplásticos nos ecossistemas e na saúde humana, percebendo, por exemplo, como interagem com outros poluentes ou como são transferidos através das cadeias tróficas, mas também no desenvolvimento de soluções que permitam reduzir este e outros tipos de poluição marítima, minimizando os seus impactos. Aqui há também um papel importantíssimo a desempenhar pelos cidadãos e por toda a sociedade na redução das fontes de emissão de plásticos.

Considera que empresas e ensino superior atuam de forma conjunta ou de forma distinta, no que respeita à procura de estratégias, cooperação e investigação para o combate ao declínio continuado da saúde dos nossos oceanos?
O combate pela saúde dos oceanos passa por toda a sociedade, e a colaboração entre ensino superior, centros de investigação e empresas é essencial para que seja possível não só travar a degradação dos ecossistemas aquáticos e marinhos, mas também contribuir de forma inovadora para a sua regeneração. Nesse sentido, há já alguns exemplos de trabalho conjunto, principalmente através de projetos de investigação e desenvolvimento, mas há ainda um longo caminho a percorrer.

Qual tem sido o contributo dos Fundos da União Europeia no reforço de redes de I&D e na formação de equipas catalisadoras para que a ciência e a economia do mar estejam ao serviço da sociedade?
Estes fundos têm sido essenciais na promoção de projetos nacionais e internacionais e no estabelecimento de redes de I&D que permitam dinamizar sinergias entre investigadores e outros agentes da economia do mar, colocando o conhecimento ao serviço da sociedade. Neste contexto, o CIIMAR tem trabalhado ativamente na fronteira do conhecimento dos oceanos e da inovação, contribuindo para o desenvolvimento de soluções e produtos inovadores que permitam responder aos atuais desafios societais e económicos, incluindo novos produtos de origem marinha com aplicações medicinais, industriais e ambientais, exploração sustentável dos oceanos, monitorização ambiental e preservação dos serviços dos ecossistemas oceânicos e costeiros.

Na sua opinião, qual/quais o(s) principal(ais) passos ou políticas que o país deve adotar para estar na vanguarda na preservação marinha e dos oceanos?
A preservação dos oceanos requer um esforço conjunto e concertado a nível local, nacional, europeu e mundial. Daí a importância de Portugal estar alinhado não só com a área de missão “Oceanos, mares, águas costeiras e interiores saudáveis”, lançada pela União Europeia no âmbito do programa Horizonte Europa, mas também com os objetivos da Década das Nações Unidas da Ciência do Oceano para o Desenvolvimento Sustentável (2021-2030).

Desde o início da pandemia que tem desenvolvido, conjuntamente com outros investigadores do CIIMAR, e em parceria com a empresa Águas do Porto, análises às águas residuais para detetar vestígios de Covid-19. Pode falar-nos um pouco sobre as vantagens e desvantagens deste tipo de rastreio?
Este é mais um exemplo da atividade de investigação do CIIMAR posta ao serviço da sociedade. Respondendo a um desafio das Águas do Porto, otimizámos metodologia que nos permite monitorizar semanalmente a presença de material genético do vírus SARS-CoV-2 em amostras de águas residuais da cidade do Porto. Este tipo de análises está a ser implementado por toda a Europa, podendo fornecer informação importante relativa ao aparecimento de novos surtos, ou à eficiência das medidas de controlo da pandemia. Estas análises permitem complementar os dados clínicos e epidemiológicos da população, uma vez que as águas residuais recebem os vestígios de vírus excretados por toda a população, incluindo os casos assintomáticos. No entanto a sua interpretação não pode ser feita de forma direta, uma vez que existem diversos fatores que interferem com a presença do material genético do vírus nas águas residuais, como, por exemplo, a pluviosidade, que pode levar à diluição das amostras, sendo, portanto, necessária a sua integração em modelos de predição. No futuro, a análise de águas residuais poderá também vir a ser uma ferramenta muito importante para a deteção do aparecimento de novos vírus em circulação na população e, eventualmente, conseguir prevenir numa fase precoce futuras epidemias, ou até pandemias.


Poderá consultar mais informações e contactos na página pessoal da investigadora, acessível aqui.


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