Investigadores U.Porto

U.Porto Reitoria SIP
Aurora Teixeira
Faculdade de Economia da Universidade do Porto / Centro de Economias e Finanças da Universidade do Porto (CEF.UP) / Instituto de Engenharia de Sistemas e Computadores, Tecnologia e Ciência (INESC TEC)

Integra livro "Mulheres na Ciência", 3ª Edição (2021)


Para si, enquanto investigadora, o que simboliza integrar a 3.ª edição da obra “Mulheres na Ciência”, de 2021*, lançada pela Ciência Viva?
Simboliza o reconhecimento da perseverança e qualidade do trabalho desenvolvido ao longo dos últimos 25 anos, que resultou de um esforço coletivo, constituído por uma vasta e muito rica (em conhecimento e amizade) rede de coautores e uma excelente base de apoio humano (funcionários da FEP, do INESC TEC, família) e infraestrutural (serviços e equipamentos bibliográficos e informáticos).

Fale-nos um pouco do seu percurso científico na U.Porto, e de que como este foi importante para a obtenção da homenagem que lhe foi feita na obra “Mulheres na Ciência”.
Entrei na FEP, enquanto docente, em 1994. No entanto, o meu percurso científico iniciou-se com os trabalhos de mestrado, na FEP, concluídos em 1997, que me despertaram para o desafiante mundo da investigação científica. Nesse mesmo ano, iniciei o doutoramento no Reino Unido, no SPRU – Science Policy Research Unit (Universidade de Sussex, R.U), um dos principais centros de investigação em política e gestão de ciência, tecnologia e inovação ao nível internacional, beneficiando de uma bolsa de 4 anos atribuída pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT). Regressei à FEP em 2001 e, em 2004, representando a FEP, tive o privilégio de estar integrada na equipa que criou o Mestrado em Inovação e Empreendedorismo (MIETE), uma parceria FEUP/FEP, iniciando uma prolífera e multidisciplinar ligação de investigação com diversos colegas da FEUP e do INESC TEC. Em 2007, a convite do Presidente do INESC TEC, coordenei em termos científicos, a recém criada Unidade de Inovação e Transferência de Tecnologia (UITT). Nessa altura, tive a oportunidade de participar diretamente no Programa UTAustin | Portugal, em concreto na UTEN (University Technology Enterprise Network), uma rede empresarial de comercialização e internacionalização da ciência e tecnologia produzida em Portugal. Neste âmbito, coordenei vários surveys nacionais aos Gabinetes de Transferência de Tecnologia e desenvolvi o Projeto Open Innovation, que envolveu o estudo das relações Universidades-Empresas em Portugal. A investigação aplicada desenvolvida, orientada para informar e formar as políticas científica, de inovação e económica, terá, penso eu, contribuído para a distinção “Mulheres na Ciência" de 2021.

Pode falar-nos do trabalho que tem desenvolvido no Centro de Economia e Finanças da Universidade do Porto (CEF.UP), e sobre o contributo que pretende, com este trabalho, deixar para a sociedade?
Em paralelo com os trabalhos na área da economia e gestão da inovação, fui desenvolvendo, no CEF.UP, investigação relacionada com a dinâmica da produção científica e a evolução da economia portuguesa no longo prazo, com enfoque para as questões do capital humano, comércio internacional, mudança estrutural, pobreza e desigualdade de rendimento. Em concreto, procurei, neste conjunto de trabalhos, a resposta a questões relacionadas com quais os fatores associados ao atraso estrutural da economia Portuguesa, face aos países mais desenvolvidos da Europa. Seguindo a lógica dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, é meu entender que necessitamos cada vez mais de uma investigação científica rigorosa ao serviço da sociedade, analisando problemas estruturais concretos da economia portuguesa (e.g., baixa produtividade, elevados níveis de pobreza e desigualdade), que contribuam para a conceção e implementação de políticas adequadas e que permitam ultrapassar o ciclo vicioso das baixas produtividades-baixos salários-reduzida capacidade de inovação-baixo nível de vida material que caracteriza a economia Portuguesa. Gostaria que o trabalho que tenho desenvolvido neste âmbito tivesse algum impacto a este nível.

Consegue identificar 2 ou 3 marcos, na sua carreira profissional, que tenham sido mais relevantes para si?
Posso identificar 3 marcos que coincidiram com 3 prémios de natureza científica que me foram atribuídos:
- 1999: Prémio Conselho Económico e Social para dissertação de Mestrado e a publicação do meu 1º livro, “Capital Humano e Capacidade de Inovação. Contributos para o estudo do crescimento Económico Português, 1960-1991”.
- 2006: Prémio Foreign Direct Investment – API/Universidade de Coimbra, com o estudo desenvolvido em coautoria com a minha amiga Ana Teresa Tavares Lehmann, “Foreign Direct Investment, Human Capital and Technology: an Application to the Portuguese Case, with a Policy-Making Focus”, publicado em livro pela Editora Vida Económica.
- 2018: Obtenção de 2 dos 4 prémios atribuídos pelo Gabinete de Estratégia e Estudos do Ministério da Economia (GEE) e pela Agência Nacional de Inovação (ANI) no âmbito da Call ‘Inovação baseada em Conhecimento’, com os artigos “The efficiency of Portuguese Technology Transfer Offices and the importance of university characteristics” (com André Monteiro) e “Persistence in innovation and innovative behavior in unstable environments” (com Joana Costa e Anabela Botelho).

Num contexto de investigação cada vez mais multidisciplinar e em cooperação, pode falar-nos um pouco sobre os temas de investigação a que se tem dedicado?
Os meus trabalhos de investigação no âmbito da inovação, designadamente sobre transferência e comercialização de tecnologia, empreendedorismo e inovação aberta, foram sempre caracterizados por uma elevada multidisciplinaridade (envolvendo, sobretudo, as áreas científicas da economia, gestão e engenharia) e cooperação nacional (com colegas da FEUP, do INESC TEC, do Instituto Superior Técnico e da Universidade de Aveiro) e internacional (com investigadores do IC2 da Universidade de Texas Austin, nos EUA e do Politécnico de Turim, Itália).

Sucintamente, quais foram os principais resultados do projeto “Universidade Empreendedora: o caso da Educação Superior em Portugal e o seu impacto na competitividade regional”. Como perspetiva, em Portugal, a cooperação universidade-empresa?
Este projeto teve como objetivo principal investigar o impacto da orientação empreendedora das Universidades na cooperação Universidade-Empresa e na competitividade regional. Foram analisadas todas as Universidades públicas portuguesas e vários Institutos Politécnicos, tendo sido produzida uma quantidade significativa de publicações científicas, nomeadamente 1 livro (“Examining the Role of Entrepreneurial Universities in Regional Development”, publicado em 2020 pela Editora IGI Global), 4 capítulos de livro, 6 artigos em revistas científicas avaliadas por pares, 3 artigos em anais de conferências, 5 comunicações em conferências nacionais, 2 comunicações em conferências internacionais, e 2 relatórios dirigidos a autoridades de política e ao setor empresarial.

Na sua carreira de investigação científica, foi por várias vezes distinguida com o “Best Paper Award”. Que conselhos daria à comunidade científica da U.Porto, e a todos/as aqueles que se encontram atualmente a redigir um artigo científico, de forma a aumentarem a qualidade da sua produção científica?
Não existem ‘receitas mágicas’. Se as houvesse, seria de esperar que eu conseguisse publicar todos os meus artigos em revistas de elevado impacto científico. Estou muito longe disso. É um processo de aprendizagem contínua, repleto de falhas e insucessos, que exige do investigador muito empenho, entusiasmo e capacidade de reagir às adversidades, aproveitando, sempre que possível, as críticas dos pares para melhorar continuamente. É igualmente importante procurar fazer ciência com impacto na sociedade, não perdendo o foco da análise e da resolução de ‘problemas reais’, contribuindo para informar e formar os decisores de política.

Atualmente, para fazer face ao contexto de pandemia da COVID-19, as universidades e politécnicos, forçosamente, tiveram de reorganizar-se. Como é que vê o futuro do Ensino Superior "pós- COVID-19"?
O papel central da Ciência, Tecnologia e Inovação no combate à pandemia COVID-19 e à crise económica dela resultante exigiu, de facto, às Universidades (e Entidades de Investigação em geral) um enorme esforço e reorganização, esforço esse não acompanhado de necessários e adequados aumentos nos investimentos públicos. A manter-se o contínuo subfinanciamento do Ensino Superior e das atividades relacionadas com a Ciência, Tecnologia e Inovação designadamente em domínios como a Saúde, a Indústria 4.0, ou Inteligência Artificial, fundamentais do ponto de vista estratégico para aumentar a preparação para choques e desafios futuros, incluindo as mudanças climáticas, antevejo um futuro pouco auspicioso para o Ensino Superior. Fala-se muito, em termos políticos, na aposta na inovação e educação, mas na prática “Eles falam, falam, falam... mas não [acontece] nada.” Uma aposta séria nestes domínios exige um comprometimento duradouro, um verdadeiro ‘pacto de regime’, por parte das autoridades de política, na afetação de recursos (financeiros e humanos), na monitorização, e na avaliação efetiva das políticas públicas implementadas.

Que apreciação faz do panorama científico português na sua área, e de uma forma geral?
É inquestionável que o sistema científico português observou, nos últimos 30 anos, uma evolução notável, quer em termos de produção, quer em termos de impacto científico, na generalidade das áreas científicas. No entanto, na última década, o progresso científico observado foi, em grande parte, resultante do esforço de investigadores e entidades do sistema científico e tecnológico. Esteve completamente ausente uma estratégia científica nacional integrada e coerente com vista alcançar um desenvolvimento económico sustentável. Sem uma estratégia nacional capaz, os enormes e louváveis esforços individuais, de investigadores e entidades do sistema científico e tecnológico, não são sustentáveis e não produzirão o impacto económico e social desejável e compatível com a qualidade dos ativos que o país possui. Tem-se feito muita e boa Ciência em Portugal, mas pouca Inovação. São evidentes as deficiências ao nível da criação de valor a partir do conhecimento gerado pelas atividades de I&D, o reduzido peso dos setores e de atividades produtivas de elevada intensidade em conhecimento e a ainda muito ténue colaboração entre empresas e as entidades produtoras de ciência.

Na sua opinião, qual/quais o(s) principal(ais) passos ou ações de valorização científica que mais lhe fazem sentido que o país adote, nos tempos que correm?
Precisamos de reter, acarinhar e valorizar os nossos investigadores mais jovens, dignificando a carreira de investigação e combatendo o flagelo da precariedade. Os Governos devem, de uma vez por todas, considerar a Ciência, Tecnologia e Inovação um designío central do desenvolvimento. Um país sem (ou com fraca) Ciência, Tecnologia e Inovação é um país sem futuro.


Poderá consultar mais informações e contactos na página pessoal da investigadora, acessível aqui.



* O livro "Mulheres na Ciência", 3ª Edição (2021) está disponível aqui.

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