Experiência de um dos Investigadores com maior número de candidaturas submetidas ao H2020
Fale-nos um pouco sobre o seu percurso científico na U.Porto.
Não será um percurso convencional. Comecei no Departamento de Engenharia Mecânica, creio que nos anos 90, depois passei para o Departamento de Engenharia Electrotécnica e de Computadores, também da FEUP. Mestrado e Doutoramento realizados na FEUP. Passei muito tempo nos Estados Unidos, mais em particular na Universidade da Califórnia em Berkeley, no âmbito de um protocolo de cooperação com aquela universidade. Trabalhei em Automated Highway Systems, em projectos de defesa e, em meados dos anos 90, orientei a minha investigação para os veículos não tripulados. Mais tarde, fui um dos fundadores do Laboratório de Sistemas e Tecnologias Subaquática (LSTS), de que sou responsável. Este é hoje um laboratório de referência internacional na área de sistemas de veículos não tripulados. Temos uma cooperação estratégica com a Marinha Portuguesa e protocolos de cooperação com a NASA-Ames, Universidade do Hawaii, Universidade da Califórnia em Berkeley, Naval Unidersea Warfare Center da Marinha dos Estados Unidos, Universidade Noruguesa de Ciência e Tecnologia, entre outros. Temos uma significativa experiência operacional orientada para o desenvolvimento de novos sistemas para observação e exploração sustentável do oceano. Em 2018 liderei, na qualidade de Chief Scientist uma campanha com a duração de 3 semanas a bordo do R/V Falkor, financiada pelo Schmidt Ocean Institute, que teve por objectivo a demonstração de uma nova abordagem para observação do oceano baseada em múltiplos veículos submarinos, aéreos e de superfície não tripulados. Continuamos a desenvolver estes sistemas e tecnologias para uma presença sustentada e e economicamente sustentável nos oceanos.
De que forma a docência consubstancia com a investigação financiada?
Tento trazer para a docência os métodos, os processos e os exemplos dos nossos sistemas e das nossas operações, com um foco muito especial em aspectos de Engenharia de Sistemas.
Tendo já submetido aproximadamente 30 candidaturas ao H2020, tem uma experiência acumulada na redação de propostas. O que aconselha a ter em conta em termos do planeamento de uma proposta?
Não me recordo do número exacto. O número de projectos aprovados foi cerca de 10. Em termos de planeamento de uma proposta, parece-me que é importante ter uma boa ideia, explicá-la bem, ter boas parcerias, e ter tempo adequado para a escrita e revisão da mesma. No caso da FEUP, temos tido um excelente apoio do Gabinete H2020.
Na sua opinião, quais são os fatores fundamentais para a redação de uma boa proposta?
Primeiro, uma boa ideia, depois uma boa estruturação da mesma, garantindo que se responde de forma efectiva aos desafios da chamada de projecto, e, depois, um processo de revisão crítica das várias versões da proposta. Finalmente, é preciso tempo, e tempo de qualidade.
Pode falar-nos um pouco sobre os projetos financiados atualmente em execução, nos quais participa / lidera? Quais as suas temáticas e principais objetivos?
Neste momento participamos em 6 projectos H2020. As temáticas destes projectos andam sempre em volta da missão do LSTS, que tem a ver com o desenvolvimento de sistemas não tripulados para exploração e observação do oceano. As temáticas são variadas: inspecção de navios, desenvolvimento de derivadores costeiros e oceânicos, sistemas de planeamento e controlo para múltiplos veículos, formação avançada na área de Inteligência Artificial e aprendizagem, observação do oceano e, ainda, uma rede de infra-estruturas robóticas submarinas. Dou particular destaque ao projecto Marine robotics research infrastructure network – EU Marine Robots (EUMR), que coordenamos, e que inclui 15 parceiros, de 10 países, que representam o que de melhor se faz em termos de robótica submarina na Europa. Neste âmbito, somos também financiados para dar acesso competitivo às nossas infraestruturas, em particular aos nossos veículos não tripulados. Tivemos algumas dezenas de projectos aprovados para acesso às nossas infraestruturas. Tivemos candidaturas de todo o mundo.
O que é mais e menos valorizado, pela sua experiência, nos projetos da sua área científica?
Começa a haver uma tendência, talvez demasiado forte, e talvez algo perversa, pela valorização dos aspectos da imagem, havendo, talvez por isso, o receio de uma desvalorização da substância.
Que conselhos daria a todos/as aqueles que se encontram atualmente a desenvolver propostas de investigação, de forma a prepararem-se melhor, e responderem de forma mais competitiva, aos futuros concursos/projetos de Investigação e Desenvolvimento (I&D), no programa quadro Horizonte Europa (2021-2027)?
É necessário conhecer bem os programas, ter uma boa rede de contactos, e ter uma visão bem clara para os desenvolvimentos futuros.
De que forma perspetiva a carreira científica em Portugal, e de que modo está associada à captação de financiamento?
É uma questão bastante complexa, que requer bastante mais espaço e tempo, que o previsto para esta entrevista. Mas a verdade é que as perspectivas de carreira científica em Portugal não são particularmente animadoras.
Na sua opinião, qual o principal passo ou política que o país pode lançar para ser uma referência europeia na sua área de investigação?
Mais uma questão difícil. Não resisto a ser algo provocador, não pretendendo com isso dar uma resposta cabal à pergunta. Diria que precisamos de diminuir significamente o impacto da burocracia, e de alguma falta de organização, nas nossas actividades. Como é que podemos competir, em igualdade de circunstâncias, com colegas de outros países que, para além de terem uma carga lectiva significamente menor, terão uma carga burocrática mais simples e organizada?
Que conselho daria a um jovem investigador em início de carreira?
Conhecer o mundo, identificar um, ou mais, bons mentores, e diversificar a sua participação em projectos. E, também, um pouco de rebeldia.
Poderá consultar mais informações e contactos na página pessoal do investigador, acessível aqui.