Investigadores U.Porto

U.Porto Reitoria SIP
Ana Rita Lado Ribeiro
Faculdade de Engenharia (FEUP) / Laboratório de Processos de Separação e Reação – Laboratório de Catálise e Materiais (LSRE-LCM)

Vencedora de ERC Starting Grant ERA-ARE


Fale-nos um pouco sobre o seu percurso científico na U.Porto e o que mais valoriza na FEUP.
Sou investigadora do Laboratório de Processos de Separação e Reação – Laboratório de Catálise e Materiais (LSRE-LCM) do Departamento Engenharia Química da Faculdade de Engenharia (FEUP), que integra desde 2021, juntamente com o LEPABE e com o CEFT, o novo Laboratório Associado ALiCE, o maior laboratório português em engenharia química. A conclusão do meu doutoramento em Biotecnologia (especialidade em Ciências e Engenharia do Ambiente) na Universidade Católica Portuguesa, trouxe-me à FEUP, em 2014, para abraçar um Pós-Doutoramento. Nessa altura, arrancava um projeto liderado por uma empresa (Adventech), cujo responsável na FEUP era o Professor Adrián Silva, a quem devo a aposta que fez em mim para desenvolver um Pós-Doutoramento integrado nesse projeto (NEPCAT – Novo equipamento envolvendo processos catalíticos integrados para tratamento de poluentes orgânicos e desinfeção de águas), em complemento com o desenvolvimento de uma linha de investigação em Ferramentas Analíticas para Monitorização Ambiental no LSRE-LCM, enquadrada no grupo de investigação que se dedica à Catálise e Materiais de Carbono. Menos de um ano depois, foi-me atribuída uma bolsa FCT de Pós-Doutoramento e, entretanto, fui contratada como investigadora doutorada de nível inicial ao abrigo de uma norma transitória que aprovou um regime de contratação de doutorados a termo certo. Na última edição do Concurso de Estímulo ao Emprego Científico Individual, lançado pela FCT, foi-me concedido um contrato como investigadora auxiliar. O que mais valorizo na FEUP e na U.Porto são as pessoas e o ambiente vivido no dia-a-dia da instituição. Valorizo a promoção de sinergias entre as diferentes unidades orgânicas e respetivas unidades de investigação, assim como o estímulo ao desenvolvimento de parcerias internacionais - embora ainda tenhamos um caminho a percorrer nestas áreas. Gostaria de destacar a boa comunicação fora de portas que a U.Porto (e particularmente a FEUP) desenvolve, de forma a dar voz à Ciência.

Consegue identificar 2 ou 3 marcos, na sua carreira profissional, que tenham sido mais relevantes para si?
Sou licenciada em Ciências Farmacêuticas e, na altura em que terminei o curso, havia mais ofertas de emprego do que farmacêuticos. Por esse facto fui logo contratada como farmacêutica adjunta, o que troquei sem hesitações pela oportunidade que, entretanto, surgiu para dar aulas. Este 1º marco foi responsável pelo meu contacto com o mundo académico e da investigação, que rapidamente me fez confirmar a certeza da minha escolha. O 2º marco foi a seleção para a posição de investigadora de Pós-Doutoramento no projeto NEPCAT, na FEUP, uma posição para a qual concorri sem acreditar que pudesse ser selecionada. O 3º, e aquele que se revela até ao momento como de maior destaque, é a conquista deste projeto ERC, da qual dependeu muito ter-me predisposto a sair da minha zona de conforto, nas duas situações anteriores.

O que representa, para si e para o seu grupo de investigação, a aprovação do projeto ERC Starting Grant ERA-ARE - A new ERA for Environmental Risk Assessment: Chirality as a tool towards environmentally safe pharmaceuticals?
A aprovação deste projeto representa o reconhecimento máximo do meu mérito científico, permitindo estabelecer e liderar um grupo de investigação constituído por uma equipa multidisciplinar com massa crítica, reconhecido internacionalmente na área da relação entre a quiralidade de antibióticos e a resistência bacteriana em cenários ambientais.

Fale-nos um pouco do projeto ERA-ARE. Como surgiu a ideia, qual a sua missão e objetivos?
A ideia já estava a ser maturada há algum tempo, mas a concretização nesta tipologia de projeto decorreu da constatação de um problema que é transversal a (quase) todos os cientistas em Portugal: a necessidade de se autofinanciarem. Apesar (da maioria) dos investigadores gostarem muito do que fazem, e de serem realizados profissionalmente, todos temos a consciência diária da precariedade, o que desestabiliza a vida pessoal e profissional, pois passamos muito tempo a preparar candidaturas - não só para financiar os projetos, mas também para financiar as nossas posições. Além de suportar a contratação da equipa, a aquisição de equipamentos e consumíveis, etc., uma ERC Grant permite financiar o contrato do investigador proponente. O projeto ERA-ARE visa contribuir para a compreensão do papel dos processos ambientais enantioseletivos no comportamento e destino dos antibióticos quirais, presentes no ambiente em quantidades residuais. Os resultados serão úteis para prevenir o desenvolvimento de resistência a antibióticos, por um lado criando diretrizes inovadoras de avaliação de risco ambiental dos antibióticos quirais e, por outro, despertando o interesse da indústria farmacêutica na pesquisa de medicamentos mais seguros para o nosso meio ambiente.

Qual tem sido o contributo dos Fundos da União Europeia para o seu trabalho de investigação?
A verdade é que tenho concorrido nos últimos anos a vários projetos financiados pela UE e este (ERC Starting Grant) foi o primeiro em que fui bem-sucedida, o que é uma excelente estreia. No âmbito dos projetos nacionais, já tinha sido bem-sucedida como investigadora principal (SAMPREP e STAR), como investigadora responsável, na FEUP, num projeto que envolve várias instituições (ENANTIOTOX) e como membro, em outros projetos.

Durante os próximos 5 anos constituirá um grupo de trabalho para levar a cabo o projeto galardoado pelo Conselho Europeu de Investigação (ERC, na sigla de língua inglesa). Fale-nos dos perfis da equipa, e de que forma o projeto irá motivar a criação de sinergias entre equipas de investigação, dentro e fora da U.Porto.
Na FEUP, está prevista a contratação de 2 doutorados de nível inicial, 2 estudantes de doutoramento e 1 bolseiro de Pós-Doutoramento. Além da FEUP, este projeto envolve o Instituto Federal de Hidrologia da Alemanha - Bundesanstalt fuer Gewaesserkunde (BfG), onde está prevista a contratação de um bolseiro de doutoramento. Além disso, o projeto conta com uma comissão consultiva composta por 3 investigadoras portuguesas e 5 investigadores estrangeiros. A minha integração em Ações COST será importante para permitir continuar a estabelecer redes de investigação internacionais com parceiros que partilham os mesmos interesses científicos.

Que conselhos daria a todos(as) aqueles que se encontram atualmente a desenvolver propostas de investigação, de forma a melhor se prepararem, e responderem de forma mais competitiva, a futuros concursos de financiamento de projetos de IC&DT, como é o exemplo do Conselho Europeu de Investigação?
O conselho que pode ser mais útil é preparar a candidatura com tempo: tempo para maturar as ideias, tempo para escrever e reescrever, ler e reler, mas, também e não menos importante, para conhecer muito bem as características destas candidaturas (por exemplo, assistir a todos os workshops disponíveis, ver os vídeos do canal Youtube ERC, ler/ouvir testemunhos de candidatos, ver templates de projetos aprovados que são disponibilizados). Fulcral, também, é pedir a colaboração de amigos e colegas para lerem e comentarem a candidatura, assim como simular a apresentação e entrevista na presença de quem tiver disponibilidade para ajudar - quer especialistas na área, quer não especialistas -, uma vez que nem todos os membros do painel avaliador são especialistas na área do projeto.

No contexto da sua investigação, está envolvida em Ações COST (CA18225; CA17133), as quais ainda a decorrer. Que balanço retira desta experiência, e que dicas gostaria de partilhar com a restante comunidade científica da U.Porto, de forma a incentivá-los a integrar, também, uma ação COST?
As Ações COST tiverem um papel muito importante no desenvolvimento da minha carreira, na medida em que me permitiram contactar com outros investigadores, conhecer outras instituições e grupos de investigação, desenvolver trabalhos em parceria, e construir redes de investigação.

Portugal apresenta dados preocupantes relativos à poluição da água. Na sua opinião, de que maneira a poluição e as alterações climáticas influenciam a atual qualidade e oferta da água? Como perspetiva o futuro da água em Portugal?
Preocupa-me não só o futuro da água em Portugal, mas também o presente. Embora este último ano tenha sido atípico, a procura de água em Portugal tem sido superior à oferta. De facto, a poluição da água e as alterações climáticas agravam o problema de escassez de água que nos tem afetado nos últimos anos e, por isso, temos de agir já, para garantirmos que o nosso país não vai voltar a sofrer de níveis de escassez de água como aqueles a que assistimos em anos anteriores. É preciso fazer uma boa gestão dos recursos hídricos, usar a água de forma eficiente, evitar desperdícios, reduzir a poluição de forma drástica, promovendo o tratamento de efluentes na origem e a reutilização de água em diversos cenários (agrícola, industrial e doméstico). Nos tempos em que vivemos, é importante relembrar que cerca de 75% da nossa água é utilizada na atividade agrícola e pecuária e que, destas atividades, depende a segurança alimentar e um desenvolvimento económico e social sustentável.

Como cientista, que apreciação faz do panorama científico português na sua área de investigação e em outras áreas, de um modo geral? Considera que a ciência é devidamente valorizada em Portugal?
Considero que, quer na minha área, quer noutras áreas, temos excelentes investigadores e a prova disso é o reconhecimento internacional de muitos grupos de investigação portugueses. Eu costumo dizer que, em Portugal, se faz muita ciência de excelência com muito pouco. É verdade, não é um cliché. Testemunho isso frequentemente, quando, em visitas a laboratórios internacionais com muito mais financiamento, constato que em Portugal otimizamos, de forma exemplar, os parcos recursos que temos à disposição. Contudo, a ciência ainda não é devidamente valorizada em Portugal. Se por um lado, o financiamento está aquém das necessidades, com taxas de sucesso extremamente baixas em concursos da FCT, o setor empresarial, no geral, ainda não reconhece as competências e a mais-valia que os investigadores doutorados podem trazer a uma empresa. Temos assistido a pequenas melhorias nos últimos anos, por exemplo, com a transição das bolsas de pós-doutoramento para contratos de trabalho, embora as condições para a entrada na carreira de investigação ainda não estejam integralmente criadas.




Poderá consultar mais informações sobre a investigadora aqui.

 Copyright 2023 © Serviço de Investigação e Projetos da Universidade do Porto.
Todos os direitos reservados.