Investigadores U.Porto

U.Porto Reitoria SIP
Jorge Mota
Faculdade de Desporto da Universidade do Porto / Centro de Investigação em Atividade Física, Saúde e Lazer (CIAFEL) / Laboratório para a Investigação Integrativa e translacional em Saúde Populacional (LA ITR)

Atividade de investigação em atividade física e efeitos relacionados com a saúde


Fale-nos um pouco sobre o seu percurso científico na U.Porto.
Após a licenciatura entrei como docente na Faculdade de Desporto da U.Porto e desenvolvi o trabalho normal associado ao envolvimento académico, tendo terminado o meu doutoramento 1992. Em 2003, conjuntamente com os Professores José Oliveira e José Alberto Duarte, criamos o CIAFEL com o objetivo de dar visibilidade a uma área científica de Atividade Física e Saúde, em desenvolvimento. Fizemos uma primeira candidatura à avaliação da unidade de investigação pela FCT e, desde aí, temos vindo a solidificar o contributo no âmbito do trabalho de formação nos mestrados e doutoramentos bem como na articulação com outros grupos nacionais e internacionais. Criamos condições de interação com outros grupos de investigação, aumentando a cooperação e recebendo colegas que foram valorizando a nossa produção científica. Também desenvolvemos estratégias de valorização dos RH na integração de redes e projetos internacionais bem como na solidificação de recursos e equipamentos disponíveis. Recentemente, com o Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto (ISPUP) e a Unidade Multidisciplinar de Investigação Biomédica (UMIB), constituímos o Laboratório Associado ITR.

Consegue identificar 2 ou 3 marcos na sua carreira profissional mais relevantes para si?
Ter ido para a Alemanha fazer um estágio/formação na Escola Superior de Desporto de Colónia e, a partir dai, ter concluído o meu doutoramento na U.Porto. A idealização/construção e finalmente aprovação/Avaliação do CIAFEL por parte da FCT. O trabalho desenvolvido como diretor da faculdade, particularmente por ter estado associado ao momento de transição das instalações antigas para as novas (onde estamos atualmente), com as diferentes implicações na organização e estruturação da instituição.

Sendo diretor do CIAFEL – Centro de Investigação em Atividade Física e Saúde, pode falar-nos um pouco do trabalho que se tem desenvolvido nesta unidade de investigação?
O CIAFEL tem procurado, desde sempre, orientar a sua investigação tanto para a ciência básica como aplicada, considerando diferentes domínios de investigação e áreas de conhecimento. Privilegiamos o trabalho multidisciplinar tendo em consideração a diversidade biológica, psicológica e sociocultural da condição humana na saúde e na doença. Através da investigação usando o modelo animal, procuramos desvendar os mecanismos explicativos da interação do exercício com o organismo, e desenvolvemos programas de intervenção em contexto clínico e/ou populacional (comunitários) para a produção de conhecimento acerca dos benefícios da atividade física e do exercício na saúde.

Na sua opinião, dos projetos desenvolvidos pelo CIAFEL, consegue identificar e falar-nos um pouco sobre aquele, ou aqueles, que considera terem tido um grande impacto na sociedade?
Sem dúvida que, pela natureza da sua expressão comunitária e social, o projeto com os “idosos” agora denominado “Mais Ativos, Mais Vividos”, liderado pela Professora Joana Carvalho, e que se iniciou nos finais dos anos 90, tem tido uma relevância significativa. Outros projetos de algum impacto foram o projeto ACORDA liderado pelos colegas Maria Paula Santos e José Carlos Ribeiro bem como, do ponto de vista de prática/apoio clínica, o BaSEIB, liderado pelos Professores Hélder Fonseca e José Oliveira e o projeto em decurso, com o IPO, com pacientes com doenças neoplásicas (Professor Daniel Moreira Gonçalves), apresentam resultados com significado.  

Pela sua experiência enquanto profissional ligado à atividade física e aos efeitos relacionados com a saúde do exercício físico, considera que nos últimos anos os portugueses estão mais ou menos ativos?
Creio que a resposta depende daquilo que serve como referência ao ser “mais ativo”. Penso que a população adulta e os mais idosos estão mais conscientes da necessidade da prática e da exercitação regular. As crianças, mais dependes da interação de terceiros e com maior carência de liberdade e disponibilidade, podem sentir mais dificuldade. Contudo, os dados de avaliação do observatório de atividade física, no qual colaboramos, e recentemente publicados, indiciam a inexistência de alterações significativas nos 10 anos que decorrem entre os dois períodos de análise (2008-2018). No entanto, existem algumas evidências que, especialmente nos mais novos, a pandemia criou condições para um menor envolvimento em práticas desportivas regulares, seja no plano federativo seja no plano escolar e /ou nos espaços exteriores. Neste sentido, temos de nos organizar para que a prática estruturada e uma maior liberdade na mobilidade possa ser garantida.

Na sua perspetiva, quais são os principais motivos para o sedentarismo da população portuguesa?
A tecnologia associada às práticas do dia-a-dia, retiram a mobilidade espontânea e mais inconsciente por parte da generalidade da população. Retirando práticas formais de exercício e as informais, mas conscientes, o momento de utilização do corpo “em movimento” é diminuído na prática diária. Neste sentido, há uma necessidade de consciencialização da utilização do corpo-movimento como um mecanismo de combate à ausência de exigência e disponibilidade física, para a grande maioria das ações do dia-a-dia.

Nos últimos dois anos, o mundo viveu assolado por uma pandemia. Com o regresso à normalidade, quais considera serem as oportunidades na área do desporto? Onde estão estas oportunidades, na sua opinião?
Depois de um período difícil de confinamento e de limitação das ações individuais, a prática desportiva e a “liberdade” inerente à sua execução surgem como uma oportunidade de alterar as circunstâncias que estiveram associadas à pandemia. O fenómeno da prática desportiva, na sua visão ampla, com as suas implicações positivas não apenas no domínio biológico, mas também, e provavelmente, mais importante na sua implicação no domínio psicológico e mais-valia de interação social, representam uma oportunidade não desprezível. Penso que os clubes, escolas e as estruturas autárquicas têm um papel significativo a desenvolver pelas ações, nos distintos planos e setores populacionais, que podem oferecer. Não se pode descurar as obrigações do estado/governamentais enquanto farol de orientação no âmbito das políticas públicas que podem consubstanciar apoios aos diferentes domínios de expressão da prática desportiva.

Os temas de investigação ao qual se tem dedicado assentam em questões relacionadas com a atividade física e os efeitos relacionados com a saúde, nomeadamente a sua relação com as doenças não transmissíveis. Que desafios futuros prevê nestas temáticas, num mundo cada vez mais ligado à tecnologia?
Se a atividade física/exercício tem sido associada, seja na prevenção primária, seja na secundária, como um fator protetor/terapêutico adjuvante, maior será a sua importância nos tempos vindouros face às alterações quotidianas produzidas pelo crescente uso da tecnologia, no sentido que esta diminuiu a necessidade de realizar movimento (atividade física) e, consequentemente, menor dispêndio energético e aptidão física. A importância do exercício ganhou ênfase também na fase que vivemos da pandemia, pelo fato de uma parte importante dos estudos manifestarem melhores desempenhos e reações quer à infeção quer à sua proteção por parte de indivíduos mais ativos. Por outro lado, não se pode esquecer segmentos específicos (por exemplo, espaço reabilitação) em que as tecnologias podem oferecer pistas/orientações para a melhoria e utilização do exercício bem como o uso da tecnologia com poder de assistência a populações mais desfavorecidas ou elemento de melhoria qualitativa do desempenho motor/desportivo. Não sendo o exercício uma panaceia para tudo e todos os estados patológicos, a coexistência do “mais ativo” na ação terapêutica dos fármacos poderá ter uma função acrescida. No meio desta questão, é importante salientar a necessidade da prática desportiva e das brincadeiras autónomas por parte das crianças/jovens numa construção da personalidade quer no contexto da individualidade quer no contexto social.

Como cientista, que apreciação faz do panorama científico português na sua área de investigação, e em outras áreas de um modo geral? Considera que a ciência é devidamente valorizada em Portugal?
No âmbito das ciências do desporto creio que temos crescido, seja na qualidade, seja na quantidade dos projetos e da produção científica desenvolvida. Temos colegas com reconhecimento nacional e internacional nos diferentes domínios em que o exercício e a prática desportiva se podem integrar. As políticas científicas nem sempre têm apoiado devidamente os esforços desenvolvidos, particularmente no que concerne aos recursos humanos, à sua valorização, enquadramento e potencialização.

Na sua opinião, qual/quais o(s) principal(ais) passos ou políticas que o país deve adotar para estar na vanguarda do desenvolvimento e implementação de programas relacionados à atividade física e promoção da saúde?
Do ponto de vista do apoio direto às atividades de investigação, o fato do exercício/desporto terem perdido autonomia, enquanto domínio de avaliação, no âmbito dos processos de apoio por parte da FCT, nomeadamente dos projetos de investigação, trouxe complexidade e dificuldades acrescidas nas atividades desenvolvidas, uma vez que as lutas pelos recursos sejam financeiras, sejam humanos, tornaram-se particularmente difíceis. No plano das políticas públicas foi desenvolvido o Plano Nacional de Promoção da Atividade Física, que julgo ter sido uma iniciativa positiva de visibilidade e de potencialização de ações e manifestações públicas para esta questão. Contudo, a natureza de interação setorial necessita de reforço e sobretudo de uma consciencialização, seja nas medidas educativas (escola, por exemplo), seja no apoio ao desporto federado (que não apenas de alta competição), seja nas políticas de ação (por exemplo, o ambiente e/ou ação social - idosos) que exigem uma visão integrada dos distintos setores.
 





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